quinta-feira, 9 de maio de 2013

ÀS QUINTAS FALAMOS DO CNBDI NO KUENTRO (6) — AS EXPOSIÇÕES (3) — ALAN MOORE ARGUMENTOS


Alan Moore, nascido em Northampton, Inglaterra, em 18 de Novembro de 1953


ÀS QUINTAS FALAMOS DO CNBDI — 6
AS EXPOSIÇÕES — 3 

ALAN MOORE - ARGUMENTOS 

20 de Setembro a 31 de Dezembro de 2002 

Comissariado
Rick Veitch
Pedro Mota

Comissão Executiva
Cristina Gouveia, Nelson Dona, Eduardo Conceição, José Eduardo Ferreira, Lígia Macedo e Rosário Teixeira

Textos do Catálogo
Pedro Mota
David Soares
Rick Veitch


Foi uma das melhores exposições do CNBDI e, para mais inédita a nível mundial - a primeira exposição dedicada a Alan Moore, o construtor de histórias para serem desenhadas. E porque se trata de uma exposição sobre argumentos - mostrando obviamente os ditos, desenhados por fabulosos autores do desenho - este post tem mais palavras que imagens. Começamos pelo texto de José de Freitas na Introdução e um excerto do texto de Pedro Mota no Catálogo. Por fim, uma nota publicada por Sara Figueiredo Costa no seu blogue Beco das Imagens, referindo a cedência de obras de Alan Moore à cidade de Charleroi na Bélgica, para uma exposição comissariada por Paul Gravett.
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Foi há cerca de três anos que iniciámos a edição de comics americanos em Portugal, começando pelos títulos da Marvel. Naquela altura, nem nos dávamos conta do panorama geral da banda desenhada anglo-saxónica no nosso país... um verdadeiro deserto de edições de autores de língua inglesa! Lentamente, fomos construindo um catálogo de comics, partindo dos super-heróis para progressivamente alargarmos as nossas edições a outros géneros. De entre os autores anglo-saxónicos, Alan Moore é sem dúvida o nome cuja ausência mais estranheza nos causou, já que é legítimo afirmar que ele é provavelmente o melhor argumentista de banda desenhada de todos os tempos. E nenhum dos seus livros estava editado no nosso país! 

Já há perto de um ano que tínhamos concebido o plano de lançar as obras de Alan Moore, projecto que por motivos vários demorou a arrancar, e que se tudo correr bem, se iniciará ainda este ano no âmbito do Festival da Amadora (como os americanos dizem, shameless plug-in!), dando finalmente a conhecer um pouco do seu trabalho ao público português. Por esse motivo, é-nos obviamente muito grato ver o CNBDI homenagear a obra global de Alan Moore, bem como dos inúmeros desenhadores de grande qualidade que com ele colaboraram, com uma exposição que é provavelmente a mais completa já realizada até hoje no mundo inteiro. Mais do que isso, é um enorme prazer poder associar o nosso nome à edição do catálogo dessa exposição, oportunidade que não queremos deixar de agradecer ao CNBDI, em particular a Nelson Dona. 

Resta-nos desejar que os leitores deste catálogo (que pela sua qualidade constitui uma referência, e não apenas a nível nacional) fiquem entusiasmados, ou no mínimo intrigados, com a riqueza e versatilidade do universo de Alan Moore, e que ele seja também a oportunidade para os fãs portugueses alargarem os seus horizontes a outros géneros da banda desenhada, enriquecendo o panorama da nona arte no nosso pais. 

José de Freitas
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"This is fiction; not a lie." 
Alan Moore, "Voice of the Fire" 

“ (...) Quando começou a carreira de escritor, Alan Moore tinha todas as desculpas para falhar como autor. Seria o emprego, a família, ou qualquer outro factor externo o responsável pelo seu insucesso. Tomou então a decisão de assumir o controlo total do seu trabalho e assumir toda a responsabilidade pelo seu eventual sucesso ou falhanço. 

Mesmo em termos políticos, Moore não consegue conceber outro sistema político que não seja a anarquia. Por isso, se há algum tema constante na sua obra é efectivamente o apelo à afirmação do indivíduo e à responsabilidade individual. A consciencialização para o facto de o indivíduo dever tomar conta de si próprio. Se o fizer, nada o pode impedir no seu processo de descoberta e realização, da sua identidade individual e da sua dimensão universal. 

Esta opção levou Moore a uma maior consciência da sua voz individual, e a enfrentar todos os desafios que se colocavam em termos de criatividade, independentemente da forma ou do género. 

No que respeita à forma, releva que, de obra para obra, Moore vai adquirindo conhecimentos técnicos a vários níveis, designadamente ao nível da estrutura. Isso permite-lhe passar das tiras de cinco vinhetas para as meias pranchas, destas para as histórias de duas e quatro pranchas, e destas para as vinte e duas pranchas do comic-book, e destas para histórias com mais de trezentas pranchas. Quanto ao género, uma das preocupações de Moore é a sinceridade do autor. "A emoção é transmitida ao leitor. Se as mesmas palavras forem escritas com emoção e sem ela, o leitor dará pela diferença. É algo de muito técnico. Uma espécie de reacção química e mágica. Eu sou muito bom a fazer com que os leitores chorem. É algo que consigo fazer desde muito novo. Mas para escrever uma cena que vai fazer com que os leitores chorem, eu tenho de estar a chorar. O mesmo se aplica às cenas para fazer rir. Eu rio descontroladamente quando estou a escrever o Jack B. Quick. É que, se eu não me rio, por que é que o leitor há-de rir?" 

Para Moore, ser um escritor significa ter a capacidade de transmitir qualquer coisa ao leitor, como se este a tivesse presenciado. E isso envolve transmitir a emoção. 

Mas a transmissão da emoção não é uma particularidade da banda desenhada. Provavelmente, autores de música ou pintura ou outra coisa dirão o mesmo. A verdadeira particularidade da banda desenhada poderá ser - e isto é apenas uma teoria - a importância da imagem e do texto, e a combinação única que a banda desenhada faz dos dois elementos. "Da forma como eu compreendo a divisão entre o lado esquerdo do cérebro, e o lado direito, e em termos muito gerais, a metade esquerda lida com o racional, a linguagem, a articulação de frases. A metade direita lida com o irracional, o inconsciente. Pode ser que a palavra seja a unidade de conta da metade esquerda, e a imagem seja a unidade de conta da metade direita. E há realmente algo de único na maneira como a banda desenhada combina palavras com a imagem. Eu sei que foram feitos testes no Pentágono, para apurar a forma de transmitir a informação de um modo mais directo e eficaz, de forma a que essa informação fosse retida, e concluíram que essa forma é a banda desenhada. Não é o texto sem imagens, nem o texto ilustrado. Penso que isso se deve ao facto de a banda desenhada apelar simultaneamente às duas metades do cérebro. Há pessoas que não sabem ler banda desenhada. E a explicação que dão para não saber ler banda desenhada é que não sabem por onde começar - se pelo texto, se pela imagem. Se fizermos a mesma pergunta a qualquer leitor de banda desenhada, ele não saberá dizer por onde começa. É uma leitura simultânea" . 

A mestria de diferentes géneros e formatos de banda desenhada é uma das características que mais tem destacado Alan Moore. Mas ele prefere evidenciar uma outra. "Acho que o meu maior talento é o trabalho em colaboração. Tento sempre conhecer as pessoas com quem trabalho, e consigo trazer ao de cimo o melhor delas. Muitos dos meus colaboradores fizeram comigo os melhores trabalhos das suas carreiras." Alan Moore tem trabalhado com alguns dos mais conceituados nomes da indústria, e "a este nível, é normal tentarmos ultrapassarmo-nos uns aos outros. Não há rivalidade. É um processo saudável e amigável. Se eu escrevo uma história, é natural que o desenhador queira ultrapassar-me com a sua visão. E no capítulo seguinte da história, eu terei de arranjar algo de ainda melhor. Por isso, o trabalho do colaborador é também fonte de inspiração". 

Moore procura efectivamente conhecer a fundo os seus colaboradores: a forma como pensam e reagem, aquilo que gostam e não gostam. A forma como Alan Moore obtém este conhecimento depende de autor para autor. Às vezes a troca de opiniões é sobretudo telefónica, outras vezes a conversa desenvolve-se mais através dos próprios guiões (...)” 

Pedro Mota

Algumas das pranchas em exposição reproduzidas do Catálogo. Mas como no melhor pano cai a nódoa, alguém se esqueceu de identificar os autores do desenho e a que obras pertencem - portanto aqui ficam assim mesmo.



  
  

Algumas fotos da inauguração, que o nosso amigo Dâmaso Afonso conseguiu desencantar no seu arquivo fotográfico:



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ALAN MOORE 'VIAJA' ATÉ CHARLEROI, NA BÉLGICA

Do Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem, na Amadora, chega-nos o seguinte press-release:

O Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem da Amadora cedeu, temporariamente, pranchas de banda desenhada e documentos originais de Alan Moore à cidade belga de Charleroi que, actualmente, tem patente uma exposição retrospectiva da obra do mais consagrado argumentista de bd. 

Trata-se da segunda exposição retrospectiva mundial de Alan Moore – a primeira realizada a nível mundial foi concebida pelo Centro Nacional de BD e Imagem (CNBDI) e que esteve patente entre 20 de Setembro e 31 de Dezembro de 2002. Moore, argumentista inglês, é considerado como o mais importante argumentista de banda desenhada dos últimos vinte anos e as suas histórias são conhecidas em todo o mundo. Para quem não conhece a sua vasta obra, basta lembrar que, por exemplo, o recente filme “A Liga dos Cavalheiros Extraordinários”, com a participação de Sean Connery, é baseado numa história sua. 
Alan Moore é o autor, entre muitas outras, das seguintes histórias, passadas a banda desenhada por desenhadores, igualmente, reconhecidos: A Small Killing; Watchmen; Greyshirt; From Hell; V for Vendetta e Swamp Thing. Ao longo dos anos, foram vários os desenhadores ingleses e norte-americanos que colaboraram com este argumentista: Rick Veitch, Kevin O´Neill, David Lloyd, Totleben, entre outros. 
O CNBDI, após a concepção da primeira exposição mundial sobre a obra de Moore, ficou na posse de cerca de quarenta pranchas de banda desenhada e diversos documentos de trabalho como guiões (alguns que nunca tinham estado acessíveis ao público). Agora, algumas das obras que possuímos foram emprestadas a Charleroi, para a exposição comissariada por Paul Gravett e que estará patente nesta cidade belga até ao dia 4 de Abril. 

Felicitando o CNBDI pelo intercâmbio, deixamos os leitores com uma prancha de A Liga dos Cavalheiros Extraordinários, em francês.

Sara Figueiredo Costa em Beco das Imagens (Fev., 2004)

Alan Moore 
(não, não é o David Soares aos 60 anos)

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Devido à grande quantidade de texto deste post, só na próxima semana apresentaremos a continuação do texto de José Ruy, Amigos do CNBDI (6)

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