domingo, 16 de fevereiro de 2014

GAZETA DA BD (21) NA GAZETA DAS CALDAS - Prémios de Banda Desenhada em Portugal – 2014


Gazeta das Caldas, 14 Fevereiro 2014

Gazeta da BD - 21
Prémios de Banda Desenhada em Portugal – 2014
Jorge Machado-Dias
Director do BDjornal e do kuentro.blogspot.com

Já que estamos no início do ano editorial e quando se perfilam as movimentações dos três prémios “nacionais” a livros de banda desenhada existentes neste país, será interessante uma abordagem prévia mais incisiva às organizações desses mesmos prémios e sua divulgação. Os prémios de que falamos são, como todos os interessados saberão, os “Troféus Central Comics” – organizados pelo site online Central Comics –, os “Prémios Profissionais de Banda Desenhada” – organizados desde o ano passado por um conjunto de profissionais e não profissionais ligados ao ramo – e os “Prémios ‘Nacionais’ de Banda Desenhada”, organizados pelo Festival AmadoraBD.


Começando pelos primeiros, os “Troféus Central Comics”, direi que sempre foram os prémios que mais prezei até hoje, não só pela filosofia “universalista” da votação, feita através da internet – com meios para impedir mais do que uma votação por votante –, mas também pela abrangência das publicações/obras/autores/editores seleccionados. As minhas divergências com os regulamentos destes prémios em algumas edições – e que me levaram mesmo a estudar e a propor novos regulamentos para os mesmos, fundamentado em pesquisas de prémios internacionais europeus (e alguns problemas de nomenclatura esclarecidos directamente com as entidades competentes) – acabaram por se concentrar na questão das designações de alguns dos prémios, onde continuam a existir algumas incongruências e abundam ainda alguns americanismos que considero despropositados quando se trata de Banda Desenhada europeia. Mas, apesar destas questões, continuo a pensar que se trata da melhor organização de premiações neste país, mau grado a fraca divulgação que continuam a ter nos media em geral.


Quanto aos “Prémios Profissionais de Banda Desenhada”, apesar da consideração que tenho pela maioria dos organizadores dos mesmos, tive desde o início da sua instituição (no ano passado), alguns desacordos estruturais. Não enfatizando, desde já (como fiz erroneamente a certa altura por falta de acesso aos regulamentos dos Prémios), a questão de alguns dos organizadores serem gente ligada à edição de livros de BD, o que acaba por se tornar irrelevante nas premiações. O meu desacordo é sobretudo pelo modo como foi congeminado aquilo a que chamam “grande júri”. Ora, sabendo nós que as obras/autores seleccionados para votação, abrangem todo o leque de edições efectuadas durante o ano a que respeitam as premiações, não nos parece curial, por exemplo, que o “grande júri” inclua autores, cujas obras possam vir a ser premiadas. Mesmo que esses autores estejam, estatutariamente impedidos de votar nas suas próprias obras – existirá sempre a dúvida de que poderão eventualmente influenciar, ou não, os seus parceiros jurados.

Não se percebe, em primeiro lugar, a necessidade um “grande júri” de 25 elementos – lembremos, já agora, que no Festival de Angoulême deste ano, para não irmos mais longe, o júri dos prémios, que abarcaram cerca de setenta obras seleccionadas, foi composto, para além do presidente do Festival, por seis jurados, sendo quatro deles jornalistas especializados em BD e outros dois, autores não presentes nas obras seleccionadas. Defendo que um júri deste tipo, neste país, deveria ser eventualmente reduzido, no máximo a dez elementos (o que chega perfeitamente para o nosso pequeno meio bedéfilo), devendo ser composto apenas por jornalistas/críticos e lojistas – nenhum deles editores de BD, evidentemente. Depois, a designação de “Prémios Profissionais” parece-me contraproducente, num país onde não existem verdadeiros profissionais de Banda Desenhada, a não ser os que trabalham para editores estrangeiros, nomeadamente americanos e que nem sequer entram no leque dos premiados.

Pela capacidade de conglomerar espaços de divulgação nos media – seja na imprensa escrita, seja nas televisões ou rádios –, estes prémios, também pela sua capaciade de se difundirem internacionalmente (devido aos conhecimentos de alguns dos intervenientes na sua organização), seriam também os ideais para oferecerem uma boa divulgação da BD portuguesa extra fronteiras. Não creio, contudo, que isso seja conseguido com a estrutura regulamentar em vigor, sobretudo na referida composição do “grande júri”.


Quanto aos “Prémios ‘Nacionais’ de Banda Desenhada”, organizados pelo Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora (designação actualmente abreviada para AmadoraBD) as coisas acabam por ser mais complicadas. Isto porque, mais uma vez, por questões estruturais, que não cabem na cabeça de ninguém minimamente entendido nestas coisas, só são admitidas a concurso as obras de que os seus editores enviem directamente seis exemplares para a organização. Ora, nem todos os editores, nomeadamente os “pequenos editores”, estão na disposição de enviar para concurso seis exemplares dos livros que editaram. Não só porque os livros são caros, mas também porque não lhes compete enviar exemplares para um concurso que, a ser Nacional, deveria abarcar toda a produção, sem esta exigência do envio de seis exemplares (um para cada jurado). Sendo, para mais, o maior Festival de BD realizado no país, não se compreende a não existência de uma equipa que recolha a informação (e aquisição de exemplares dos livros) de toda a actividade editorial de Banda Desenhada realizada no ano a que se referem os Prémios.

E sendo estes os prémios com maior visibilidade no mercado – porque, quer queiramos, quer não, o AmadoraBD tem já uma marca de vinte e quatro anos no mercado, como Festival de BD, quer pela mediaticidade do próprio Festival conseguida ao longo dos anos junto do público, quer pelo seu grande peso no meio bedéfilo – não podemos deixar de condenar este meio de apresentação de “propostas a prémios” que nos parecem altamente redutoras da produção editorial de Banda Desenhada em Portugal. Isto porque os “pequenos editores” ficam sempre fora do processo – e estamos a falar de editores que, apesar da sua “pequenez”, são importantes na edição de BD em Portugal – como a editora de Manuel Caldas (a Libri Impressi), a Chili com Carne, ou outros, incluindo os variados autores auto-editados. E o “Nacionais” entre aspas, com que escrevemos sempre a designação destes Prémios, deve-se a toda esta argumentação porque, de facto, não são Nacionais, uma vez que não abrangem toda a produção nacional de BD.


Portanto, digamos que as Premiações de Banda Desenhada neste país, estão na proporção exacta do que é, em Portugal, o mercado de BD: uma tremenda menoridade! Só nos resta contribuir para que melhorem, embora as contribuições críticas sejam quase sempre mal aceites pelos organizadores – mas isso é uma velha pecha nacional.

Nota: Texto integral que, por falta de espaço teve que sofrer alguns cortes na versão impressa.

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